Uma fotografia.

A fotografia traz a tona sentimentos. Esse é um dos principais razões de se capturar uma imagem. A foto vem da tentativa de transformar em real algo relacionado a sentimento. Mostrar uma situação em que a pessoa se encontra e transmitir através da imagem aquilo que sentiu naquele determinado momento. As fotos trazem à tona o que sentimos ao observar a cena capturada ou até mesmo mostra o envolvimento dos objetos ou das pessoas presentes no momento clicado. Isso é, não somente vivermos um sentimento, mas dar a oportunidade à outras pessoas de enxergar a beleza que nos foi apresentada. Todos os dias podemos ver isso na prática. Em albuns de família ou ensaios profissionais, por trás de todas as imagens existe algo que por algum motivo levou a pessoa que produziu a foto a considerar a imagem importante o suficiente para o registro.

A redação do jornal Diário do Rio Doce não ficou de fora dessa realidade. Em certo ano, perto do dia dos pais, foi feito um pedido a um renomado jornalista. O profissional era responsável pela área de literatura e artes de um reconhecido jornal da cidade de Governador Valadares. A ele foi dada a tarefa de fazer uma matéria que seria divulgada no jornal onde trabalhava, em comemoração ao feriado. Estavam lhe faltando idéias para o texto, quando percebeu que nessa matéria em especial não se tratava de criatividade, e sim sentimento. Mesmo antes de saber como começar sua matéria, o jornalista sabia de uma coisa: não iria apelar para os clichês de todos os textos relacionados a datas como essa. Mas, como colocar no papel a relação de um pai pra com um filho?

Os dias passavam e o prazo de uma semana que deram ao jornalista estava acabando. Até então nenhuma linha tinha sido escrita. Depois de passar a semana inteira trabalhando preocupado em escrever essa matéria, ele resolveu que passaria o final de semana sem pensar no texto que teria que entregar na semana seguinte. Decidiu que seria melhor ficar um tempo sem se preocupar, para depois ter uma idéia melhor de como faria para descrever em poucas linhas, uma relação tão intensa.

Logo no dia seguinte, pela manhã, o jornalista se barbeava quando aconteceu o fato que traria a idéia de que ele precisava. Ao olhar para o espelho, ele viu que a filha, que tinha pouco mais de 3 anos, o observava. Não somente isso, ela vestia uma camisola de sua mãe e tinha em seu colo uma boneca. O jornalista ficou extremamente emocionado ao perceber que a filha estava cuidando da boneca como se fosse sua própria filha. Ela estava "amamentando", mesmo que de brincadeira, a boneca sem ao menos saber a importância que isso tem para uma mãe, e muito menos o que aquela cena representou para o seu próprio pai.

Quando a menina percebeu que seu pai estava olhando para seu reflexo no espelho, ela ainda disse a ele: "está vendo, pai. Estou fazendo igual a mamãe faz comigo". Emocionado, foi quando ele percebeu que essa relação era inexpicável. O jornalista viu que somente quem tem o privilégio de estar nesse papel é que sabe o tamanho do sentimento envolvido.

Ao olhar para a inocente menina brincando com sua boneca, ele teve a certeza de que para o resto da vida ele iria ser responsável e cuidar da filha com tamanha devoção e inocência, assim como a pequena menina fazia com um de seus brinquedos.

No mesmo momento, ele buscou sua máquina fotográfica e registrou a cena da menina junto com sua boneca. A fotografia serviu para transformar em real o sentimento que estava envolvido naquele instante. Servia para mostrar a quem tivesse acesso à imagem tudo aquilo que o pai estava enxergando por trás daquela simples brincadeira de criança.

O pai estava extremamente emocionado por que, talvez pela primeira vez ele estava percebendo o verdadeiro significado de viver em família. Tinha percebido naquele momento que tudo o que ele tinha ouvido anteriormente sobre pais que dão a vida para um filho não eram apenas clichês bobos. O jornalista foi então ao encontro de sua filha com a certeza de que aquela pequena pessoa mudaria todos os seus dias desde o dia do seu nascimento.

Logo depois do acontecido, foi imediatamente para sua máquina de escrever na tentativa de descrever o que tinha acabado de passar. Dessa forma, ele acreditou que seria a melhor maneira que ele teria de transmitir para os leitores o verdadeiro papel do pai e homenagear a todos eles. Escreveu sobre o que ele considerava família, no significado de ser pai e na responsabilidade que um filho trás para a vida de uma pessoa.

Mas foi na fotografia tirada que todos puderam ver a beleza daquele instante. Puderam perceber o porquê de aquele simples ato da menina ter se tornado um marco tão importante na vida daquele pai. O que tinha de tão especial a ponto de fazer o jornalista entender coisas que até então tinham lhe passado despercebidas, como o fato de um simples gesto da sua filha ter o poder de transformar o seu dia e que aquele vida tão curta da menina tinha se transformado na sua própria vida. "E vendo ela ali, aquele ser tão indefeso, se doando pela boneca - ainda que só de brincadeira - eu vi a necessidade de me doar inteiro por ela. Era minha mais nova realidade..."

Por que o que vai ficar na fotografia são os laços invisíveis que haviam.